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Apesar dos problemas, SUS é considerado um dos maiores sistemas públicos de saúde do mundo, afirma ex-ministro Alexandre Padilha

São 30 anos de avanços embora não tenhamos chegado ainda a um Sistema Nacional Público de qualidade e universal

06/06/2018
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O SUS representa uma das políticas mais importantes e ousadas já aplicadas no Brasil

Em matéria veiculada na Folha de São Paulo (8/5), uma análise do Banco Mundial aponta que a melhoria da eficiência do Sistema Único de Saúde (SUS) poderia resultar numa economia de 16,5% nos gastos em saúde nos próximos 12 anos e isso será fundamental para garantir a sustentabilidade do sistema em um cenário de subfinanciamento e envelhecimento populacional. O ex-ministro da Saúde Alexandre Padilha estima que o desperdício de recursos da saúde possa ser superior. Para ele, o combate ao desperdício é uma responsabilidade e uma missão fundamental para aprimoramento do SUS, mas existem alguns desafios: O primeiro é no âmbito da gestão e da governança do SUS para que haja combate permanente de qualquer situação de irregularidade ou interesses privados. O segundo é superar o modelo biomédico, o médico centrado, e centrado no hospital, que ainda existe no conjunto da saúde pública brasileira. “O fortalecimento de um modelo técnico-assistencial pautado na atenção primária, fora do espaço hospitalar, da equipe multiprofissional, na inserção cada vez mais próxima da comunidade, é decisivo para que se possam reduzir desperdícios e preparar o SUS para mudanças epidemiológicas, demográficas e o envelhecimento que existe no País e que vai ampliar cada vez mais a necessidade dos cuidados em relação às doenças crônicas não-transmissíveis”, detalha. O terceiro desafio é investir cada vez mais em redes integradas. “Em 2011 quando constituímos as primeiras políticas de rede de atenção passamos a financiar o serviço de forma integrada e não isolada ou por procedimento ou equipamento de saúde isolado. Um dos grandes desafios para a consolidação de redes integradas no SUS é superar a fragmentação dos municípios e a fragmentação por especialidades”, aponta Padilha.

De acordo com o ex-ministro, desde a sua criação, o SUS é um sistema de saúde absolutamente subfinanciado e esse desafio não foi enfrentado pela sociedade brasileira. Para ele, isso fica evidenciado se observarmos outros sistemas públicos internacionais. “A simples comparação em relação ao que se gasta e ao que se investe na economia das famílias na saúde suplementar com que se investe na saúde pública mostra claramente o quanto que o SUS é absolutamente subfinanciado”, argumenta.

Os 30 anos do SUS marcam uma das políticas mais importantes e ousadas já aplicadas no Brasil, criado com a concepção de garantir saúde universal e gratuita, sendo um direito das pessoas e dever do Estado. Entretanto Padilha reconhece que nestas três décadas o SUS sofreu duas grandes derrotas: Em 2007, quando a saúde perdeu cerca de R$ 42 bilhões sob a justificativa de que era necessário retirar o imposto sobre as operações financeiras para se reduzir os preços. E a segunda derrota do seu financiamento com a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 241/2016, que congela os gastos do governo federal pelos próximos 20 anos. “Essa proposta rasga o compromisso constitucional brasileiro de ter a saúde como direito, e esse direito ser garantido por um sistema público”, declara. Nesse intervalo houve ainda a retirada dos recursos do Pré-Sal – um dos recursos estaria destinado à saúde e à educação – o que renderia cerca de R$ 200 bilhões à saúde, nas estimativas de menos de uma década. Essa mudança no modelo de exploração teve um impacto muito forte que leva ao subfinanciamento do SUS em nosso País.

Sobre o principal legado do SUS, o ex-ministro atenta para o assistencial que provou ser possível a um país de renda média, com 200 milhões de habitantes, três níveis de governo, ter um amplo programa nacional de imunização, que levou inclusive a erradicação de doenças. “Provou ainda ser possível ter um dos mais marcantes programas nacionais de AIDS; que mais de 90% dos tratamentos de câncer aconteça pelo sistema nacional público; alcançar os objetivos do milênio antecipadamente em 2012 quando a meta do milênio 2015 (redução da mortalidade infantil, redução na incidência de tuberculose e malária); provou que era possível um país como Brasil ter o maior sistema nacional de transplantes públicos; ter uma rede de banco de sangue regulada pelo setor público. Além disso, o SUS tem um legado técnico-assistencial e político importantes para o País, quando ao longo desses 30 anos, ajudou a construir novos cidadãos, bem como movimentos e organizações que surgiram tendo o SUS como a sua principal plataforma de assistência”, acrescenta.

Questionado sobre o que o Brasil precisa para ficar mais saudável, Padilha destaca a necessidade de desenvolver outras políticas que não só da saúde, mas que promovam a saúde. Para ele, não é possível acabar com epidemias cíclicas das arboviroses sem o compromisso permanente de enfrentar o problema do saneamento básico. Ainda como exemplo de política de promoção à saúde, Padilha relata que na cidade de São Paulo, as medidas de controle de velocidade, de sinalização, de proteção ao pedestre, reduziram em 14% as internações no SUS. “Então, o primeiro passo para um Brasil mais saudável é que possamos construir um conjunto de políticas que não sejam específicas da saúde, mas que impactam sobremaneira a saúde brasileira. O segundo, é um compromisso permanente dos três níveis de governo em prol de um sistema nacional público fortemente baseado na atenção básica da saúde”, defende.

Por fim, o ex-ministro da Saúde referenda que o SUS simboliza 30 anos de avanços, embora não tenhamos chegado ainda onde precisamos, em um sistema nacional público de qualidade, universal e disponível para todos os brasileiros. “O que mais me preocupa é o atual risco de 20 anos de retrocesso com a PEC 241, que congelou os investimentos públicos no nosso País”, lamenta.