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Artigo demonstra similaridades entre artrite reumatoide e artrite crônica chikungunya

Artigo aborda as repercussões articulares da infecção pelo vírus chikungunya

06/05/2024

No Brasil, mais de 1 milhão de casos já foram relatados, destacando a amplitude do desafio enfrentado pelas autoridades de saúde

A febre chikungunya, que reemergiu como uma preocupação global, é uma doença causada por um arbovírus chamado chikungunya (CHIKV), o qual é transmitido por mosquitos da espécie Aedes. Após a transmissão viral, a doença geralmente se manifesta com febre, dores articulares intensas, erupção cutânea, dor de cabeça, fadiga e, ocasionalmente, náuseas, vômitos e diarreia. Embora raramente fatal, chikungunya pode evoluir para uma fase crônica conhecida como artrite crônica da chikungunya, afetando até 40% dos infectados. A patogênese da artrite chikungunya ainda não está clara, mas estudos sugerem que o vírus pode afetar as células-tronco mesenquimais, causando alterações que persistem por longos períodos.

A artrite reumatoide é uma doença autoimune crônica que também afeta as articulações, causando danos irreversíveis. A apresentação clínica da artrite da chikungunya pode se assemelhar à artrite reumatoide, e ambos os distúrbios compartilham mecanismos inflamatórios semelhantes, envolvendo citocinas pró-inflamatórias. O mecanismo subjacente ao dano articular crônico permanece obscuro. Medicamentos antirreumáticos modificadores da doença revolucionaram o tratamento da artrite reumatoide, prevenindo o dano articular. No entanto, o papel dessas terapias na artrite da chikungunya ainda não foi determinado.

Um artigo publicado na Revista da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical (RSBMT) intitulado “Bone erosions and joint damage caused by chikungunya virus: a systematic review” revisou sistematicamente a literatura para avaliar se a CHIKV causa danos articulares. Foram incluídos estudos retrospectivos e prospectivos, ensaios clínicos randomizados e relatos de casos que confirmaram danos articulares por meio de exames de imagem. Diversas bases de dados foram pesquisadas até uma data específica, sem restrições de idioma. O artigo incluiu estudos retrospectivos e prospectivos, ensaios e relatos de casos que avaliaram o dano articular causado pelo CHIKV.

O Dr. José Kennedy Amaral, um dos autores e único brasileiro, explica que a revisão sistemática encontrou relatos de lesões ósseas e cartilaginosas, sinovite e deformidades articulares através de diferentes métodos diagnósticos, incluindo radiografia, ultrassonografia e ressonância nuclear magnética. Questionado sobre as principais similaridades e diferenças entre a artrite da chikungunya e a artrite reumatoide observadas na revisão, o Dr. Amaral detalha que os pacientes com artrite da chikungunya têm em comum com artrite reumatoide a localização da artrite, sua distribuição e simetria, além do potencial dano articular. “Artrite da chikungunya e artrite reumatoide também compartilham perfil patogênico similar, com participação marcante de interleucinas IL-17, IL-1β, interferon alpha (IFN-α) e IL-6, por exemplo”, acrescenta.

Dos 188 estudos inicialmente encontrados, apenas oito atenderam aos critérios de inclusão. Esses estudos mostraram que pacientes com CHIKV podem desenvolver danos articulares semelhantes aos da artrite reumatoide, incluindo erosões ósseas e inflamação persistente. A ressonância magnética revelou derrame articular, erosão óssea e inflamação em pacientes com artrite da chikungunya. “Considerando a complexidade do mecanismo subjacente ao dano articular crônico na chikungunya, a principal lacuna reside em compreender se as alterações articulares encontradas são decorrentes da infecção pelo vírus chikungunya ou processos patológicos relacionados a outras doenças. Estudos prospectivos são necessários para determinar o real envolvimento da infecção viral no desenvolvimento das lesões”, destaca o Dr. Amaral.

Poucos estudos abordaram o dano articular induzido pela chikungunya, o que limita a compreensão da artrite da chikungunya. No entanto, ela apresenta semelhanças com a artrite reumatoide. “O principal desafio encontrado durante o processo dessa revisão sistemática sobre a artrite crônica da chikungunya está na falta de padronização dos métodos de imagem utilizados nos estudos analisados, além do número reduzido de sujeitos avaliados de forma geral”, acrescenta. Segundo o pesquisador, as lesões articulares foram mais bem definidas e diagnosticadas por meio da ressonância magnética.

Apesar das similaridades, as recomendações de tratamento para artrite reumatoide e artrite da chikungunya diferem. Enquanto a abordagem atual para artrite reumatoide enfoca a modificação da doença com o uso precoce e agressivo de medicamentos antirreumáticos modificadores da doença (DMARDs), a gestão da artrite da chikungunya ainda se concentra principalmente no alívio dos sintomas, com pouca ênfase na prevenção do dano articular.

No Brasil, mais de 1 milhão de casos já foram relatados, destacando a amplitude do desafio enfrentado pelas autoridades de saúde. Com a crescente prevalência da infecção por CHIKV em todo o mundo e seu impacto de longo prazo na saúde das articulações, os resultados desta revisão destacam a importância de investigações adicionais para estabelecer uma melhor estratégia de manejo e avaliar se o uso precoce de medicamentos antirreumáticos para interromper a progressão da doença e melhorar os resultados dos pacientes.

Confira o artigo “Bone erosions and joint damage caused by chikungunya virus: a systematic review” publicado na Revista da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical (RSBMT): https://doi.org/10.1590/0037-8682-0433-2023

**Esta reportagem reflete exclusivamente a opinião do entrevistado.**