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Crack: epidemia não se expande no Sudeste, mas ainda é preocupante no Norte e no Nordeste

Segundo pesquisador, usuários da droga no Rio de Janeiro e São Paulo têm usado substâncias sintéticas

14/12/2015
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A difusão do crack em regiões mais pobres, que já são mais vulneráveis, se dá pelo baixo valor, fácil portabilidade e característica varejista

Derivado da pasta base da coca, o crack já foi usado por aproximadamente dois milhões de pessoas no Brasil, segundo uma recente pesquisa do Lenad (Levantamento Nacional de Álcool e Drogas). Apesar dos números alarmantes, há uma mudança em curso relativa ao consumo da droga, que não vem aumentando na região Sudeste do País. Tal cenário ainda não é visto nas regiões Norte e Nordeste, onde a situação ainda é preocupante. Essas são as avaliações do coordenador da Pesquisa Nacional Sobre o Uso de Crack da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), doutor Francisco Inácio Bastos.

“Em 2011 havia uma grande expansão no uso do crack, mas agora, a quantidade de pessoas que usam esta droga não vem aumentando, pelo que observo nos ambulatórios”, comentou. Segundo ele, o que vem aumentando é o número de pessoas que usam substâncias diferentes simultaneamente, como drogas sintéticas.

Para o pesquisador, esta mudança de paradigma em relação ao consume de crack já era esperado. Como a droga ficou mais visada e chama a atenção das forças de segurança, houve diminuição da venda do produto por facções criminosas e, consequentemente, aumento no consumo de outras drogas.

A tendência, porém, depende das características de cada região do País. O pesquisador afirma que no Sudeste, principalmente no Rio de Janeiro e São Paulo, por serem grandes metrópoles e com renda maior, já são observadas mudanças em relação ao consumo de drogas. “Não é que o crack deixou de ser usado, mas ele passou a ser utilizado de forma intermitente. Os próprios traficantes não estão vendendo a droga. Está havendo muita alternância”, explicou.

Já no Norte e Nordeste do País, o potencial de expansão do crack é maior do que em outras regiões, de acordo com o pesquisador. Um dos fatores que contribuem para esta situação é a renda mais baixa. “O fato de ter uma substância mais barata, e o crack é mais barato, dá sustentabilidade ao mercado, mesmo que a renda local seja mais baixa”, afirmou. Além do baixo valor, o crack é de fácil portabilidade e tem característica varejista. Isso facilita a difusão da droga em regiões mais pobres, que já são mais vulneráveis, tornando o efeito ainda mais grave.

Queda no uso do crack

Segundo o pesquisador, a mudança que está acontecendo em algumas regiões do Brasil não é diferente do que houve nos Estados Unidos. O ápice do uso da droga naquele país foi na década de 1980 e, aos poucos, foi diminuindo. “Depois que isso chamou muito a atenção da polícia americana, houve várias prisões, a pena para uso de crack foi ampliada. Isso desarticulou muito a venda da droga. Foi quando surgiram outras substâncias”, disse. Bastos acredita que, em médio prazo, o consumo de crack também diminuirá no Brasil.

Outro fator que contribui para o declínio da droga é que o crack não é sustentável ao longo de gerações. Segundo o pesquisador, o doente não aguenta a vida de rua, não só pelo uso do crack, mas pelas péssimas condições de nutrição, problemas de saúde e o alto risco de infecção e de assassinato. “Não creio que uma droga com uma ação tão rápida se sustente por muito tempo. Inclusive, não tenho nenhum paciente acima de 50 anos”, ressaltou.

Além da mudança no mercado e na insustentabilidade do uso da droga por muito tempo, Bastos entende que outro fator que tem contribuído para o declínio no consumo sejam as redes de proteção social, onde a parceria público-privada é fundamental. “Houve uma ampliação grande de lugares de assistência, principalmente por grupos religiosos. Houve uma mobilização, tanto do poder público, com seus programas de governo, quanto da sociedade”, esclareceu.

Para acessar o estudo completo sobre o consumo de crack no Brasil, coordenado pelo pesquisador Francisco Inácio Bastos, clique aqui.