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Falhas na vigilância epidemiológica de doenças e vetores afeta ações de saúde pública

Erros de diagnóstico para febre de Oropouche, muitas vezes confundida com dengue, atrapalha medidas contra as doenças

12/02/2015
Mate?ria

Para o doutor Pedro Tauil, fatores como a explosão populacional urbana no mundo reduzem efetividade das ações de combate ao Aedes aegypti

O controle das doenças transmitidas por insetos que não possuem ainda vacinas preventivas ou tratamento etiológico eficaz e seguro, passa, primordialmente, pelo combate aos vetores e no diagnóstico correto das enfermidades. Porém, falhas nesses dois aspectos podem comprometer as ações de saúde pública.

É o caso do combate a um dos maiores inimigos nacionais: o mosquito Aedes aegypti, transmissor dos vírus Dengue, Chikungunya e Zika. Mesmo com campanhas anuais junto à população – como alertas sobre água parada e necessidade de uso de inseticidas, as três enfermidades são epidemias em boa parte do País.

Os dados da dengue, por exemplo, são alarmantes. O Ministério da Saúde divulgou recentemente que 1,59 milhão de pessoas foram vítimas da doença no ano passado, sendo que o número refere-se apenas até o dia 5 de dezembro. O registro já é quase três vezes maior ao de 2014 (555,4 mil).

Para o doutor em Medicina Tropical Pedro Luiz Tauil, faltam inovações nas de medidas de enfrentamento ao Aedes. Ele cita diversos fatores que impedem que as ações não sejam “muito efetivas”, como a explosão populacional urbana, com percentual alto de pessoas vivendo em condições precárias de habitação e saneamento, e a preferência pelo uso de embalagens descartáveis pela indústria moderna. Além disso, outro aspecto de risco é a enorme produção de veículos automotores, que acarreta no destino inadequado dos pneus usados – ambiente perfeito para a proliferação do mosquito por servir como depósito de larvas.

Estudos em andamento tentam achar medidas de controle mais eficazes. Algumas ideias incluem o uso de mosquitos transgênicos, larvicidas carregados pelo próprio inseto e até o A. aegypti com bactérias que os tornam incapazes de transmitir doenças. “Está-se buscando medidas de controle vetorial mais efetivas, com técnicas estrangeiras que já estão sendo testadas no Brasil”, afirma o doutor Tauil.

Recentemente, devido ao surto de microcefalia em fetos relacionada à infecção pelo vírus Zika, o governo federal intensificou a atuação no controle do mosquito. Além de aumentar a capacitação de pessoal de estados e municípios para identificar locais de proliferação do mosquito, estão sendo distribuídos inseticidas e kits de combate. Até mesmo tropas do Exército Brasileiro ajudam no desmonte de focos de proliferação do mosquito.

Vacina contra dengue

O doutor Tauil defende o reforço nas ações mesmo com uma recém-lançada vacina contra a dengue. Isso porque o produto tem uma eficácia restrita, além de não ser eficaz para outras enfermidades que o Aedes transmite.

“Essa vacina ainda não é a ideal, pois não pode ser usada em crianças com menos de 9 anos e pessoas com mais de 45 anos (grupos prioritários), além de não proteger igualmente contra os quatro sorotipos”, explica. Apesar de ser mais uma arma no combate à dengue, o produto oferece proteção de 50% contra o sorotipo 1, de 42% para o sorotipo 2, de 74% para o sorotipo 3 e de 77% para o sorotipo 4. Além disso, são necessárias três doses com intervalo de 180 dias entre elas.

O médico lembra que, mesmo com todos os poréns, a vacina reduziu significativamente as hospitalizações devido à forma grave da doença no grupo etário de 9 a 45 anos. O governo federal, no entanto, ainda não decidiu se vai adotá-la no Programa Nacional de Imunização e se será ou não para grupos prioritários, segundo o médico.

Falta de diagnóstico

O doutor Luiz Tadeu Figueiredo , em entrevista concedida para o site da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical (SBMT) publicada em dezembro de 2014 , fez um alerta para um problema de diagnóstico de uma doença semelhante à dengue, a febre Oropouche.

Além do combate ao Aedes, o controle de algumas das principais doenças vetoriais que afetam os brasileiros ainda precisa de mais atenção do sistema de vigilância epidemiológica do País. É o caso das subnotificações da febre de Oropouche, doença geralmente benigna que dura de três a cinco dias. Apesar de pouco conhecida, ela pode representar até metade dos casos que se acredita serem dengue no Brasil.

A falta de diagnóstico, muitas vezes, atrapalha as ações de saúde pública de controle dessas doenças. Até porque o mosquito transmissor da febre não é o A. aegypti, mas outro inseto bastante comum no País, o marauim (Culicoides paraenses). O vetor é corriqueiro nas áreas próximas a florestas de boa parte do Brasil, inclusive as de cidades grandes, como o Rio de Janeiro.

Os principais erros de diagnóstico decorrem de problemas como o exame clínico: devido ao fato dos sintomas de Oropouche serem semelhantes aos de dengue, os médicos apostam nessa última. Além disso, o exame sorológico pode ser positivo para dengue em uma pessoa infectada com Oropouche. Depois da dengue, este é o segundo vírus que registra o maior número de infectados no País. O primeiro surto urbano ocorreu na década de 1960 e, recentemente, foram registradas epidemias no Pará, com 30 mil casos, e no Amazonas.

Em janeiro deste ano, uma adolescente de Ribeirão Preto (SP), que passava férias no Nordeste, foi diagnosticada com febre do Oropouche. O caso é um dos dois primeiros do Brasil registrados fora da Amazônia.