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Falta de conhecimento de profissionais de saúde dificulta diagnóstico da febre Q

Drª Elba Lemos lembra que essa febre pode causar pneumonia e inflamações no fígado e no tecido cardíaco se não diagnosticada corretamente

05/07/2016
Dra.

Embora a quantidade de amostras positivas para febre Q pareça inexpressiva, chama atenção a correlação que os profissionais de saúde fizeram com a dengue no momento do diagnóstico clínico

Uma das grandes dificuldades do sistema de saúde no Brasil é a não inclusão, principalmente durante as epidemias, de outras hipóteses diagnósticas. Esse é o caso da febre Q, enfermidade que acaba sendo notificada incorretamente como dengue, por ter manifestações clínicas semelhantes à doença mais conhecida. O problema é que, se não diagnosticada corretamente, essa febre pode causar sérias complicações, como pneumonia e comprometimento do fígado e do coração.

“A falta de conhecimento ou informação sobre a possibilidade de ocorrência da doença [febre Q] por parte dos profissionais da saúde é a maior dificuldade”, reconhece a doutora Elba Lemos, chefe do Laboratório de Hantaviroses e Rickettsioses do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz).

Ela lembra que o profissional médico precisa ter um alto grau de suspeição, com base nos dados clínicos epidemiológicos, para identificar a doença que pode se apresentar na forma aguda ou crônica. Com o tratamento correto realizado nos primeiros três dias da doença na sua forma aguda, as manifestações clínicas, como a febre, podem cessar em 72 horas.

A especialista diz ainda que é imprescindível realizar o exercício do diagnóstico diferencial e considerar sempre a possibilidade de outros agentes causadores, não somente a febre Q. “Especialmente em situações nas quais exista um grande número de casos suspeitos de dengue sem confirmação etiológica e de casos considerados ‘atípicos’. Dentro deste mesmo contexto, somente para reforçar, é importante registrar que todos os casos fatais de febre maculosa brasileira no Rio de Janeiro, por exemplo, tiveram a suspeição diagnóstica inicial de dengue”, explica.

Uma pesquisa sobre o tema foi feita pela Fiocruz com 272 pacientes com suspeita de dengue. Destes, 166 tiveram a confirmação para dengue e nove foram diagnosticados com febre Q. Um dos pacientes apresentou infecção pelos dois patógenos. Todos os casos foram de entradas de um hospital de Itaboraí, no Rio de Janeiro, entre março de 2013 e outubro de 2014.

“Embora a quantidade de amostras positivas para febre Q pareça inexpressiva, chama atenção a correlação que os profissionais de saúde fizeram com a dengue no momento do diagnóstico clínico”, pontua Elba.

A forma humana de infecção mais comum da enfermidade é por inalação de partículas da bactéria Coxiella burnetii presentes no ar, por ela ser extremamente resistente ao calor, à seca e a vários produtos químicos, podendo sobreviver por longos períodos no ambiente. A doença também pode ser transmitida pelo contato com o leite, fezes, urina, muco vaginal ou sêmen de gado, ovelhas, cabras, cães, gatos e outros mamíferos domésticos, quando infectados, o que associa sua ocorrência, sobretudo a ambientes com características rurais.

Investigações da doença são recentes

Reconhecida no Brasil pela primeira vez na década de 1950 e apesar de NÃO SER comum nos grandes centros urbanos, a febre Q apenas nas duas últimas décadas passou a ser investigada nos estados da região Sudeste, embora de forma rara, segundo a doutora Elba.

Ela lamenta que as informações sobre a doença disponíveis no Brasil, atualmente, sejam provenientes de artigos publicados e de projetos de pesquisa. Desta forma, não existem dados precisos que possam auxiliar na compreensão dos problemas da febre Q no sistema de saúde.

“Fica muito claro que temos muito que pesquisar e investigar para conseguir obter um pouco mais de informação”, reconhece a pesquisadora ao revelar sua expectativa de que, com uma maior sensibilização e inclusão no diagnóstico diferencial, casos agudos e crônicos de febre Q sejam identificados e tratados. Com isso, segundo a doutora Elba, será possível avaliar a real frequência da doença no território nacional.