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Malária: Sem ações efetivas de controle, diagnóstico e tratamento, o crescimento do número de casos será maior, adverte Dr. André Siqueira

Neste mês de combate à malária, devemos reafirmar a necessidade de luta constante e bem definida contra a doença, incutindo a convicção de que a eliminação da transmissão é possível

09/04/2018
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O sucesso no enfrentamento à doença apenas será atingido quando houver compromisso político efetivo com a participação de todos os envolvidos

O aumento do número de casos de malária após anos seguidos de progresso é preocupante. Na opinião do doutor em Doenças Tropicais, o médico infectologista André Siqueira, existem vários motivos por trás deste crescimento observado, não só no Brasil, mas também em outras partes do mundo. Para ele, o tema da eliminação da doença ainda não é discutido e encampado com vigor nos diversos ambientes de saúde pública no Brasil. Neste contexto, em que a incidência de casos novos vinha diminuindo continuamente, fica difícil para os gestores locais aumentarem (ou mesmo manterem) os investimentos nesta doença quando há outras enfermidades infecciosas (como zika e chikungunya) em avanço. “No entanto, a malária apresenta reservatório infeccioso que pode ser assintomático e passar despercebido pelo sistema de vigilância passiva. Uma vez que se desmobiliza o sistema de detecção e manejo de casos, pode-se esperar um aumento nos números”, ressalta. Ainda segundo o especialista, outros motivos investigados dizem respeito às mudanças climáticas, que podem ter alterado a densidade de mosquitos anofelinos transmissores na região. Os fatores envolvidos são múltiplos e todos merecem atenção para que o País consiga contornar a situação atual.

De acordo com os dados da Fundação de Vigilância em Saúde do Amazonas (FVS-AM), o estado registrou, nos dois primeiros meses do ano, 11.707 casos da doença. O Dr. André Siqueira, que também é pesquisador do Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas (INI-Fiocruz), ressalta a necessidade de implementação de ações efetivas de controle, com diagnóstico e tratamento oportunos, bem como medidas de controle vetorial efetivas. Caso contrário, no final do ano teremos um crescimento muito maior de casos. “O sucesso no combate à malária apenas será atingido quando houver compromisso político efetivo com a participação de todos os envolvidos. Os esforços de colaboração por meio de diversas iniciativas, como Malaria Erradication Research Agenda (Malera), entre outras, deve ser usado como exemplo, assim como a rede de eliminação da malária na região da Ásia e Pacífico (APMEN), que tem conseguido reunir políticos, gestores e pesquisadores com o objetivo de eliminar a doença daquela região, onde o risco de parasitos com multi-resistência se espalharem é preocupante. Na América Latina e no Brasil temos muito a avançar nesta perspectiva, incluindo maior integração regional com a migração que acontece nas fronteiras amazônicas”, lamenta.

Abril é o mês de combate à malária: O que tem sido feito em relação ao diagnóstico e ao tratamento da doença?

O Brasil atualmente é classificado como em situação de controle, no qual a meta é a redução da incidência de casos. Com o aumento observado no último ano, é ainda mais importante a intensificação de medidas para evitar um crescimento maior e também para que não sejam perdidos os avanços conquistados na última década. O infectologista explica que se deve ter como perspectiva passar da fase de controle para as fases de eliminação da transmissão, que implicam, além do controle vetorial e tratamento oportuno de casos clínicos à adoção de estratégias que abordem o reservatório infeccioso. Para tanto é necessário o uso de ferramentas mais sensíveis e comprometimento político efetivo.

“Para o controle da malária existem duas frentes principais, o diagnóstico e o tratamento oportuno (quanto mais cedo uma pessoa infectada é tratada, menor as chances de complicações de que ela seja fonte de transmissão), e o controle vetorial, feito pela borrifação intradomiciliar e o uso de mosquiteiros impregnados”, detalha o Dr. André Siqueira ao complementar que em relação ao diagnóstico e ao tratamento oportunos, um dos desafios é que em áreas de baixa transmissão o diagnóstico é geralmente tardio, pois os profissionais deixam de considerar malária como causa de febre e muitas vezes mesmo pensando na doença, o acesso aos métodos diagnósticos não é fácil. Portanto, é um desafio manter o sistema alerta para a detecção de casos febris de malária quando o controle é efetivo, pois o retardo pode resultar no aumento de casos. Em relação ao controle vetorial, ainda há muito questionamento sobre o que funciona e como deve ser feito em diferentes contextos de transmissão e são necessárias informações sistematizadas para chegar a essas conclusões. Vale lembrar, que o Programa Nacional de Controle da Malária (PNCM) está lançando um sistema de informação de vetores em que serão registradas as medidas de controle e as aferições entomológicas, o que deve ajudar esta análise.

Questionado se há o que se comemorar neste mês de abril, o pesquisador justifica que o mês de combate à malária deve ser aproveitado como uma oportunidade de reafirmar a necessidade de combate constante e bem definido contra esta enfermidade, incutindo a convicção de que a eliminação da transmissão é possível. Ele reitera que existem diversas iniciativas e avanços sendo realizados e estes devem ser reconhecidos e utilizados como exemplos na definição de estratégias de enfrentamento. “Em nível local houve avanços, como a redução expressiva de casos em Eirunepé (Amazonas) – município que tinha um número elevado de casos – e o programa de apoiadores municipais que posiciona, pelo PNCM, profissionais capacitados para auxiliar municípios em situação crítica”, assinala ao complementar que também há avanços científicos importantes, como uma nova droga para tratamento de recaídas de Plasmodium vivax (a Tafenoquina), cujos estudos têm a participação de pesquisadores brasileiros em Manaus e Porto Velho, além do desenvolvimento de métodos diagnósticos mais sensíveis. Por fim, o Dr. André Siqueira, que também desenvolve Pesquisa Clínica em Doenças Febris Agudas, acrescenta que a perspectiva de uma vacina efetiva contra a doença ainda está um pouco distante, mas os estudos pré-clínicos têm avançado, entretanto a perspectiva de sua aplicação em larga escala em programas de saúde pública ainda não é vista”, lstima. Contudo, o pesquisador continua otimista e acredita que na próxima década haverá importantes avanços em termos de novas ferramentas para tratamento e controle da malária. “A Reunião Nacional de Pesquisa em Malária, que será realizada durante o 54º MedTrop, será uma grade oportunidade de reavaliarmos estes objetivos”, comemora.