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Saneamento básico: preocupação deveria ser proporcional ao tamanho do problema

Para entender a desigualdade de acesso à infraestrutura e serviços de saneamento básico é só percorrer os caminhos da pobreza

09/01/2017
Esgotos

Esgotos nas ruas, nos córregos e rios é uma paisagem típica brasileira, sobretudo nas áreas mais pobres

A falta de saneamento básico – problema crônico e histo?rico no País – deixa a população exposta a? doenc?as. A deficiência no tratamento e destinação adequada dos esgotos ainda causa milhares de doenças, especialmente em crianças. Para o engenheiro sanitarista do Departamento de Saúde Coletiva da Fiocruz-PE André Monteiro, as condições de saneamento no Brasil, de uma forma geral, são péssimas. “A expressão sanitária dessas condições são evidentes, basta observar as diversas doenças negligenciadas. E mais recentemente, a tragédia da microcefalia/zika e demais arboviroses”, destaca ao complementar que não teríamos tragédias como essas se tivéssemos um bom saneamento.

A questão do saneamento básico perpassa pela ampliação de sua difusão, bem como pela maior democratização dos serviços públicos. “Entretanto, nossas coberturas de rede de abastecimento de água são baixas e desiguais socialmente”, critica apontar que a intermitência no fornecimento é outro grande problema, além do alto índice de perdas de água na rede de distribuição – cerca de 40% da água tratada vira esgoto antes de atingir as casas. A rede de esgotos tem baixa cobertura, seu tratamento é cerca de um terço do coletado.

O especialista relata que esgotos nas ruas, nos córregos, rios, é uma paisagem típica brasileira. Sobretudo nas áreas mais pobres. Além disso, a prestação dos serviços de resíduos sólidos e drenagem urbana contribuem para agravar esse quadro, por exemplo, para transmissão de arboviroses, como o zika pelo Culex. “A desigualdade social brasileira é expressa por esses serviços. São cartões postais da iniquidade brasileira”, observa. E essas desigualdades regionais são marcantes. Enquanto as cidades mais desenvolvidas do País, como São Paulo e Rio de Janeiro, apresentam índices de tratamento de esgoto de 93%, outras capitais, como Belém (7,7%) e Macapá (5,5%), não gozam do mesmo privilégio.

No entendimento do engenheiro sanitarista, a desigualdade em saneamento espelha a desigualdade social. Entre regiões, intrarregional, intraestadual e intramunicipal. “Para entender a desigualdade de acesso à infraestrutura e serviços de saneamento é só percorrer os caminhos da pobreza. Renda média, condições de educação, de habitação e de urbanização têm associação direta”, lamenta ao complementar que a alocação de recursos públicos é escassa aos pobres, e as tragédias se multiplicam. O Brasil ocupa 10ª posição entre 17 países latinos em ranking de saneamento. O País perde, por exemplo, para os vizinhos Venezuela, Bolívia e Peru, segundo o Instituto Trata Brasil. No atual ritmo, especialistas avaliam que governo federal não cumprirá meta de universalizar o saneamento básico até 2033.

Cólera ameaça o Brasil?

Levando-se em consideração que a falta de saneamento básico é uma grande ameaça à saúde pública e que a principal via de transmissão do cólera é a água contaminada, o grupo social mais propenso a ser infectado é o formado pelos mais pobres, já que estes habitam áreas onde o saneamento básico é precário e costumam não ter hábitos higiênicos. O potencial de alastramento e de mortalidade desta doença pode ser exemplificado pela epidemia ocorrida em 1994 na República Democrática do Congo, no campo de refugiados de Goma, onde estima-se que em apenas um mês a quantidade de casos foi de 58.000 a 80.000, com 23.800 óbitos. No Haiti, quase 800 casos de cólera foram registrados em uma semana após a passagem do furacão Matthew, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS).

Consultado sobre o assunto, o Ministério da Saúde esclarece que higiene e o tratamento de água e esgoto são as principais formas de prevenção. A Pasta informa que o Brasil não registra casos autóctones da doença desde 2006. A última epidemia no País ocorreu de 1991 a 2000, quando houve 2.035 óbitos, de acordo com dados da VE-Cólera. Desde então não houve mais óbitos. Ainda de acordo com a nota, a situação está controlada, mas as autoridades permanecem em atenção realizando o monitoramento para o Vibrio cholerae. A ocorrência de casos suspeitos requer imediata notificação e investigação por ser potencialmente grave e poder se manifestar sob a forma de surto, o que impõe a adoção de medidas imediatas de controle. A investigação deve ser feita o mais rápido possível pelo órgão oficial de saúde capacitado para tal (centro ou posto de saúde, hospital, vigilância epidemiológica da Secretaria de Saúde).