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Testes com ‘vacina DNA contra Zika’ começaram em abril, destaca coordenador do estudo em MG, Rodrigo Correa-Oliveira

Após ter sido pioneiro na descoberta dos efeitos do zika vírus, Brasil investe agora na prevenção da doença testando a vacina

07/05/2018
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A triagem dos voluntários para o estudo em Belo Horizonte iniciou na primeira semana de abril e até agora cerca de 20 pessoas foram incluídas. Os primeiros cinco voluntários foram vacinados entre 23 e 25 de abril

Enquanto pesquisadores do mundo inteiro trabalham para encontrar formas de proteção contra o Zika Vírus (ZIKV), o Hospital da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) começou a testar a vacina chamada de “vacina DNA contra Zika”. O estudo clínico de Fase 2/2b da vacina experimental contra a infecção pelo vírus terá duração de dois anos e vai avaliar a sua segurança e a eficácia. A substância experimental já foi testada em humanos nos Estados Unidos e o estudo clínico foi aprovado por comitês de ética e agências regulatórias nacionais e internacionais. Os voluntários receberão três doses nos primeiros dois meses, sendo metade vacina e metade placebo, de forma aleatória e sem que ninguém saiba o que recebeu até que o estudo seja concluído.

O pesquisador Rodrigo Corrêa Oliveira, coordenador do estudo na Fiocruz-Minas, ressalta que os objetivos da Fase 2/2b são avaliar a segurança da vacina, bem como a eficácia em proteger contra o Zika (definida como confirmação viral de infecção com qualquer sintoma de ZIKV), em adultos e adolescentes entre 15 e 35 anos. Ele espera que a vacina induza a uma resposta especifica gerando anticorpos que reajam contra o vírus e sua neutralização. Entretanto, a expectativa para que em breve se tenha a produção para uso em larga escala ainda está longe de ser uma realidade. “Estamos em uma fase ainda inicial e esperamos obter resultados, mas a produção em alta escala só acontecerá se a Fase 2/2b do ensaio clínico demonstrar que a vacina é segura e eficaz em prevenir contra o Zika vírus. Isso será seguido pela Fase 3 de testes cruciais de eficácia, que caso confirmados, permitirá uma candidatura às agências regulatórias e à produção em massa. Os testes da Fase 2 são projetados para durar aproximadamente três anos, dado que cada voluntário será acompanhado por dois anos após a vacinação”, esclarece.

Ainda de acordo com o pesquisador, a vacina, feita com parte do material genético do vírus, poderá produzir anticorpos capazes de promover uma resposta contra a infecção em um indivíduo imunizado. “Ao contrário das vacinas produzidas com o próprio vírus, esta que será testada na Fase 2/2b é uma vacina de DNA. Ou seja, ela não tem o vírus inteiro, seja atenuado ou morto. Como ela não possui o vírus inteiro, é impossível que se desenvolva a doença a partir dela. Assim é mais segura no sentido de que as pessoas, mesmo que tenham qualquer doença que comprometa o sistema imunológico, possam tomá-la também, ressalta.

O estudo ocorrerá simultaneamente em 19 centros de pesquisa espalhados pelos Estados Unidos, América Central e América do Sul. No Brasil, além do Hospital das Clinicas em Belo Horizonte, o Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP) pretende acompanhar 120 voluntários. “No centro de Belo Horizonte, inicialmente teremos 100 pessoas participando do estudo. Caso haja evidência da transmissão do Zika, poderemos obter permissão de envolver mais pessoas. A triagem dos voluntários para o estudo em Belo Horizonte iniciou na primeira semana de abril, e até o presente momento cerca de 20 pessoas foram incluídas. Os primeiros cinco voluntários foram vacinados entre 23 e 25 de abril”, detalha. No total, são esperados 2,4 mil voluntários.

Parceria entre pesquisadores do UFMG, Universidade de George Washington e Fiocruz-Minas

O Dr. Rodrigo Correa-Oliveira, que também é vice-presidente de Pesquisa e Coleções Biológicas (VPPCB) da Fundação Oswaldo Cruz/Fiocruz, explica que os pesquisadores na Universidade George Washington (GWU) e na Fiocruz-Minas mantêm uma parceria e colaboração há mais de 17 anos para realizar estudos clínicos de vacinas experimentais contra doenças tropicais negligenciadas como ancilostomose e esquistossomose. Essa parceria também envolve o desenvolvimento de uma equipe laboratorial e clínica altamente especializada na Fiocruz-Minas, bem como a infraestrutura necessária para conduzir experimentos com vacinas de alta qualidade de acordo com as Boas Práticas Clínicas. “O patrocinador do ensaio clínico da vacina contra Zika entrou em contato com pesquisadores na GWU questionando seu interesse em sediar um ensaio clínico da Fase 2/2b por conta da parceria duradoura entre nosso grupo e pelo fato de que o Zika é um problema no Brasil. Em conjunto, todos esses fatores nos envolveram no ensaio”, relata.

O pesquisador reconhece que ter sido escolhido pelo patrocinador, bem como pelo grupo da GWU para ser um centro participante neste ensaio clínico multinacional de Fase 2 é de suma importância para a instituição e para o Brasil. “Isso demonstra que a reputação e a experiência construídas nos últimos anos pelo nosso grupo na Fiocruz-Minas e na UFMG nos tornaram um bem valioso para o País e para o Sistema Único de Saúde (SUS), já que ele será imediatamente beneficiado quando os testes encerrarem e a vacina for disponibilizada à população”, constata.

Por fim, questionado se o Brasil está preparado para prevenir novos surtos de arboviroses (des)conhecidas em áreas urbanas, o pesquisador revela não acreditar. Em sua opinião, são necessários investimentos pomposos em todos os níveis, desde pesquisa básica ao desenvolvimento rápido de diagnósticos tanto clínicos como sorológicos, bem como vacinas que possam ser usadas preventivamente e/ou para tratamento. “É fundamental que a análise epidemiológica/populacional seja feita rapidamente para acelerar nossa capacidade de reação a quaisquer vírus conhecidos ou não. Essas atividades devem estar muito bem integradas, o que se traduz em grandes investimentos”, pondera o pesquisador.