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Tuberculose: BCG previne a doença em crianças pequenas, mas não em adultos

Pesquisadores investigaram o impacto da BCG em crianças no desenvolvimento e na mortalidade por tuberculose pulmonar e extrapulmonar

10/09/2022
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Com 101 anos, a BCG é a única vacina já administrada para tratar a tuberculose, doença que atinge mais de 10 milhões de pessoas por ano

Estudo publicado no The Lancet descobriu que a vacina bacilo Calmette-Guérin (BCG) aplicada no recém-nascido para prevenção contra a tuberculose (TB), fornece proteção significativa apenas em crianças com menos de 5 anos. De acordo com o artigo, a BCG não forneceu proteção entre adolescentes ou adultos participantes. Os resultados do artigo intitulado Infant BCG vaccination and risk of pulmonary and extrapulmonary tuberculosis throughout the life course: a systematic review and individual participant data meta-analysis, discute que crianças com mais de 10 anos e adultos poderiam se beneficiar de uma dose de reforço, principalmente, se for desenvolvida nova vacina que garanta proteção depois da infância. Outro achado importante, entre os quatro estudos com dados sobre mortalidade, foi o da proteção de 75% da BCG contra morte (0.25, IC 95% 0,13 – 0,49).

Para a revisão sistêmica, foram selecionados 26 estudos longitudinais, realizados em 17 países, que incluíram quase 70 mil participantes expostos à tuberculose entre 1998 e 2018. Destes, 1.782 (2,6%) desenvolveram tuberculose, sendo 1.309 (2,6%) entre os 49.686 vacinados com BCG e 473 (2,5%) entre os 18.866 não vacinados. A efetividade geral da BCG contra todos os tipos de tuberculose foi de 18% (0,82, IC 95% 0,74 – 0,91). Avaliando os 14 estudos de coorte com informações sobre o tipo tuberculose (pulmonar ou extrapulmonar), a BCG ofereceu proteção significativa contra a tuberculose pulmonar entre todos os participantes (0,81, IC 95% 0,7 – 0,94), mas não contra a tuberculose extrapulmonar. Ao se concentrar apenas na TB pulmonar, a BCG foi 19% eficaz, mas esse efeito também ocorreu apenas entre crianças pequenas.

Estratificado por idade, o estudo demonstrou que a BCG protegeu de maneira significativa, contra todos os tipos de tuberculose, apenas crianças com menos de cinco anos (0,63; IC 95% 0,49 – 0,81). Ao avaliar apenas os contatos com teste tuberculínico positivo, a proteção ocorreu em participantes de todas as idades (0,81; IC 95% 0,69 – 0,96), inclusive com menos de 5 anos (IC 95% 0,47 – 0,97) e entre 5 e 9 anos (IC 95% 0,38 – 0,99). Não houve efeito protetor entre aqueles com testes negativos, a não ser em crianças com menos de 5 anos. Ainda segundo os resultados do estudo, a BCG foi 37% eficaz entre todas as crianças com menos de 5 anos. Não foram encontradas evidências conclusivas de que a vacina proteja crianças com mais de 10 anos ou adultos.

De acordo com o presidente da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical (SBMT), Dr. Julio Croda, um dos autores do estudo, os achados fornecem avaliações atualizadas sobre a eficácia da BCG, já que a maioria dos estudos publicados anteriormente sobre o assunto foram realizados há mais de 50 anos, com resultados variados e principalmente em ambientes com uma carga relativamente baixa da doença. Esta revisão sistemática, com metanálise dos dados individuais dos participantes, de estudos disponíveis nas bases MEDLINE, Web of Science, BIOSIS, e Embase, sem restrições de linguagem, apresenta dados dos últimos 20 anos, de ambientes de alta carga em 17 países, incluindo Brasil, África do Sul, China, Vietnã, Indonésia, Uganda e Gâmbia.

A análise examinou a variabilidade entre os estudos, incluindo o uso de testes de infecção por TB na pele e no sangue, e levou em conta fatores potencialmente confusos, como HIV, status de exposição e histórico de TB anterior, entre outros. “O desfecho primário foi o diagnóstico de tuberculose nos contatos expostos à doença e os desfechos secundários foram diagnóstico de tuberculose pulmonar e extrapulmonar e mortalidade. Após os devidos ajustes de variáveis, os resultados foram estratificados por idade e pelo status de infecção pelo Mycobacterium tuberculosis”, explica o Dr. Croda.

Por fim, o presidente da SBMT lembra que a grande maioria dos casos de tuberculose nos Estados Unidos e em outros países de alta renda ocorre em imigrantes vindos de locais com alta carga da doença, em geral países de baixa renda. “Embora nossos resultados sejam principalmente em ambientes com alta carga de tuberculose, eles também são relevantes para locais de baixa carga, ou seja, nossos achados trazem implicações importantes para os países ricos e pobres”, ressalta ao enfatizar a importância de investimentos substanciais no desenvolvimento de vacinas contra a tuberculose para que a doença possa ser controlada globalmente. “Os países também devem  considerar reforços na imunização contra tuberculose após a infância e, para isso, precisamos urgente de vacinas eficazes em adultos. Existem várias candidatas em estudo e esperamos que uma ou mais se mostrem eficazes”, encerra.