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Ciclo silvestre aproxima Zika da população e erradicação da doença pode se tornar impossível, alerta Dr. Maurício Nogueira

Os pesquisadores precisam agora entender o papel que os macacos podem desempenhar na manutenção do ciclo urbano do Zika vírus e como eles podem ser um canal no estabelecimento de um ciclo de transmissão em animais não humanos na América Latina tropical

12/12/2018
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Durante a epidemia de febre amarela, os pesquisadores observaram muitos macacos mortos, não pela doença, mas pela ação humana. O fato acendeu um alerta, pois quando saudáveis esses primatas são muito difíceis de capturar

Um artigo assinado pelo Dr. Maurício Lacerda Nogueira e pesquisadores de diversas instituições, publicado recentemente na Scientific Reports, grupo Nature, indica que existe o potencial de um ciclo silvestre para o Zika no Brasil, como ocorre com a febre amarela, por exemplo. No estudo intitulado Evidence of natural Zika virus infection in neotropical non-human primates in Brazil , os pesquisadores analisaram carcaças de macacos e verificaram que estavam infectadas pelo Zika, tanto em São José do Rio Preto (SP) como em Belo Horizonte (MG).

O Dr. Nogueira explica que a descoberta do potencial ciclo silvestre altera a forma como se entende a epidemiologia de Zika. De acordo com o pesquisador, a existência desse ciclo coloca potencialmente a Zika com reservatório muito próximo da população, o que torna praticamente impossível de erradicar a doença, o que implica na necessidade de uma vacina eficiente. “A descoberta do vírus Zika em macacos pode ser problema sério para o Brasil, pois caso realmente se confirme esse ciclo silvestre teremos epidemias mais frequentes”, ressalta.

O sequenciamento completo mostrou que o vírus era muito parecido com aquele que estava infectando os humanos. Outra evidência foi o fato de que, nos locais onde as carcaças foram encontradas, também foram coletadas, na mesma semana, mosquitos infectados por Zika. Para a realização da pesquisa, foi induzida infecção experimental por Zika nos macacos vivos. A inoculação provocou viremia, ou seja, presença de vírus no sangue. Além disso, os macacos apresentaram alteração de comportamento, confirmando a hipótese inicial dos pesquisadores, de que a infecção os tornava mais suscetíveis a serem capturados e mortos. A presença do Zika vírus nesses macacos provavelmente se explica por serem animais periurbanos, muito próximo da população, e que estavam em contato frequente com mosquitos do gênero Aedes aegypti.

Embora a descoberta tenha se dado no Brasil, Dr. Nogueira, que é pesquisador da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto (Famerp) e presidente da Sociedade Brasileira de Virologia (SBV), acredita que seja possível ocorrer em outros locais. De acordo com ele, se o vírus se silvatizar na região Amazônica, outros países da bacia amazônica também podem ter a mesma situação. Em sua opinião, a solução para minimizar o problema das doenças epizoóticas, que sempre são fontes de epidemias entre humanos, passa pela estratégia de vacinação e pelo desenvolvimento de vacina eficaz.

A capacidade de mutação e adaptação dos arbovírus ainda é um grande desafio para a ciência. Para o Dr. Nogueira, a única forma de vencer essas doenças é conhecê-las o suficiente para desenvolver vacina. “É a única forma que a gente vê nesse momento”, assinala. Em relação à perspectiva de epidemias, nesse período que antecede o início do período chuvoso no Nordeste, quando as arboviroses aparecem de forma mais intensa, o pesquisador é categórico ao afirmar que é preciso atenção também ao Sudeste brasileiro, que está extremamente vulnerável ao Chikungunya. “Nós não tivermos epidemias de Chikungunya nessa parte do País, por isso, essa é a região que mais preocupa”, atenta.

A primeira parte do estudo analisou o periurbano, agora os pesquisadores seguem verificando a existência ou não do ciclo silvestre em regiões de mata. “No momento procuramos a existência desse vírus em Manaus, em regiões de mata mais densa, com espécies de mosquitos e macacos diferentes”, finaliza o Dr. Nogueira.