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Pesquisadores encontram mosquito palha infectado por filária

Verme da mesma família do parasito que pode causar, entre outros problemas de saúde, a cegueira, foi encontrado durante um estudo sobre leishmaniose

08/05/2021
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Fotografia microscópica da cabeça de um espécime Ps. carrerai carrerai fêmea com a presença de uma larva do verme Onchocercidae. ( A ) Larvas em conformação linear e ( B ) Larvas em conformação arredondada

Pesquisadores brasileiros envolvidos em estudos sobre vetores da leishmaniose encontraram, pela primeira vez nas Américas, larvas de um verme do gênero Onchocerca em mosquito palha, transmissor da leishmaniose. A professora da Universidade Federal do Acre (UFAC), doutora em saúde pública que lidera a pesquisa, Dra. Andreia Brilhante, publicou, em coautoria, um artigo científico na renomada revista Scientific Reports intitulado “First report of an Onchocercidae worm infecting Psychodopygus carrerai carrerai sandfly, a putative vector of Leishmania braziliensis in the Amazon” relatando essa importante descoberta na área da parasitologia. Os autores conseguiram ainda gravar um vídeo com o verme em movimento, disponível na publicação.

Apesar da larva encontrada no inseto ter características morfológicas, movimentação semelhante a L3, e a espécie de flebotomíneos na qual as larvas foram encontradas ser muito antropofílica, não se sabe se o filarídeo consegue desenvolver seu ciclo até tornar-se infectante no homem, ou em que outros animais. Há, portanto, necessidade de mais investigações a partir desta pesquisa e deste achado que trouxe novidades para ciência.

A descoberta pode impulsionar novas pesquisas sobre a investigação do papel dos flebotomíneos na transmissão de outros patógenos, diferentes daqueles que já se tem conhecimento. “Além disto, mostra a importância de realizar a investigação a fresco dos insetos coletados no campo, sobretudo na região Amazônica, onde se encontra a maior biodiversidade do mundo, mesmo que muitas vezes seja difícil devido à logística ou às condições físicas de localidades de difícil acesso, quando em algumas épocas do ano, como no período chuvoso, se torna mais complexo”, ressalta a Dra. Brilhante ao lamentar a destinação escassos de recursos financeiros à pesquisa.

A pesquisadora conta que tudo começou com a realização do projeto pesquisa de seu doutorado sobre fauna de flebotomíneos e leishmanioses no município de Xapuri, cidade que fica a 187 quilômetros da capital do Acre, Rio Branco. O trabalho buscava formas flageladas de tripassomatídeos em flebotomíneos, dissecando as fêmeas que eram examinadas sob o microscópio em busca dessas formas. “As dissecções foram realizadas ainda em campo, na Gerência de Endemias de Xapuri. Para fazermos a identificação das espécies de flebotomíneos, além de outras estruturas, observávamos a cabeça da fêmea. Foi quando observamos larva de filarídeo em duas fêmeas da espécie Psychodopygus carreirai. O achado foi uma grande surpresa, pois nunca havíamos visto nada assim”, detalha a Dra. Brilhante.

As larvas foram fotografadas e o material encaminhado ao Serviço de Referência Nacional em Filarioses e Fundação Oswaldo do Cruz (Instituto Aggeu Magalhães) para que o parasito pudesse ser caracterizado por ferramentas de biologia molecular. A identificação revelou ser a larva de Onchocercidae. Questionada sobre o que explica esses flebotomíneos infectados com a larva de filarídeo, a professora esclarece que o local onde os insetos foram coletados situa-se na região amazônica, com floresta preservada, presença de diferentes mamíferos silvestres, e no entorno, são encontrados animais domésticos comuns de área rural. Segundo ela, isso leva a crer que esses animais, silvestres e domésticos podem estar participando do ciclo de transmissão desse filarídeo e infectando flebotomíneos que se alimentam neles.

O artigo informa que não há registro de doenças parasitárias causadas por filárias no município Xapuri. Porém menciona que, no passado, havia a ocorrência nas circunvizinhanças de Mansonella ozzardi, filária pertencente à Família Onchocercidae, amplamente endêmica na Região do Amazonas. Após a publicação do artigo foram realizadas algumas coletas na região e até o momento outras espécies ou exemplares de flebotomíneos infectados com estas larvas não foram encontradas. “Vamos dar continuidade aos trabalhos de campo e as investigações com os vetores, além de começar as investigações em animais domésticos e silvestres para verificar se estão infectados com esse parasita ou outros, e elucidar um pouco mais sobre o papel desses animais e vetores nos ciclos de transmissão do verme, ou seja, se de fato há algum papel epidemiológico importante ou se foi uma infecção natural sem maiores implicações epidemiológicas”, finaliza a Dra. Brilhante. O projeto foi realizado por meio de colaboração entre a UFAC, a Fiocruz Pernambuco e o Instituto de Higiene e Medicina Tropical (IHMT), da Universidade Nova de Lisboa (POR).

**Esta reportagem reflete exclusivamente a opinião do entrevistado.**