Notícias

Tristes trópicos?Sad tropics?

Ao contrário do que diz a reportagem de um jornal da Austrália sobre o artigo da PLoS Medicine, Dra. Ana Luísa Costa, psiquiatra e mestra em Filosofia da Ciência, não vê evidências de que os países pobres ou tropicais sejam mais tristes, com maior prevalência de depressãoUnlike what is said in an Australian jornal about PLoS Medicine’s article, Dr. Ana Luisa Costa, psychiatrist and MSc. in Cience Phylosophy, does not see evidence that poor or tropical countries are sadder, with greater depression prevalence

18/01/2014

tristes-tropicos-pt

Em países tropicais, muitas vezes, o impacto real dos transtornos de humor permanece obscuro, em virtude da existência de doenças consideradas mais graves, como Aids e malária

Estudo recente, publicado na PLoS Medicine ressalta a necessidade de que se considere a depressão como um relevante problema de saúde pública. O tema abre um questionamento: a felicidade é menor em países pobres e tropicais? A pergunta deixa dúvidas, uma vez que o processo para se chegar a um diagnóstico de depressão em países pobres é mais demorado, além de muitas vezes o problema não ser identificado ou devidamente tratado. A má qualidade de vida, com falta de infraestrutura básica e acesso ao lazer pode favorecer a depressão, já que sua causa é multifatorial. “Considerando que pessoas de países tropicais estão sujeitas a mais fatores de estresse, como guerras civis, violência doméstica e miséria, é possível acreditar que elas estejam mais sujeitas à depressão. Entretanto, as estatísticas mostram uma relação oposta, com incidência maior da doença em países ricos, não tropicais”, observa Dra. Ana Luísa Lamounier Costa, médica e psiquiatra da Secretaria de Saúde do Distrito Federal (SES/DF).

Em estudo divulgado na Higher Education a depressão é uma doença dos países em desenvolvimento. Entretanto, o levantamento aponta que o aumento da incidência de depressão no mundo em desenvolvimento é resultado de uma melhoria nos serviços básicos de saúde.

A especialista comenta que a resposta para esse paradoxo pode ter relação, com a facilidade de acesso dos países desenvolvidos aos instrumentos de pesquisa e ao atendimento psiquiátrico, além da assimilação cultural dos sintomas de depressão. Ela realça que em países tropicais, muitas vezes o impacto real dos transtornos de humor permanece obscuro, em virtude da existência de doenças consideradas mais graves, como aids e malária, realidade predominante em países pobres. “Em regiões vítimas de guerras civis ou de desastres naturais, esse impacto torna-se ainda maior. Isso permite que os governos direcionem melhor suas políticas de saúde pública e não negligenciem atenção aos transtornos mentais”, revela ao salientar que, infelizmente, a assistência de saúde mental no Brasil é muito deficiente.

Segundo a psiquiatra, alguns estudos relacionam a depressão a alterações de genes envolvidos no sistema serotoninérgico, mas os eles ainda são muito incipientes para que se estabeleça um grupo de risco genético. “Talvez a única maneira de minimizar o impacto da depressão atualmente seja proporcionar qualidade de vida à população, especialmente no que diz respeito à prevenção de violência e de miséria, além de facilitar o acesso a serviços de saúde mental, como psicologia e psiquiatria, para intervenção no momento mais adequado”, assinala.

Dra. Ana Luísa comenta que no Brasil a redução progressiva de leitos de internação, não tem sido acompanhada pelo aumento da disponibilidade de serviços ambulatoriais. De acordo com ela, o acesso da população a atendimentos de psicologia e de psiquiatria é insuficiente. “Para um atendimento adequado, é necessário aumento imediato de serviços de atendimento ambulatorial, bem como Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) munidos de psicólogos e psiquiatras. O treinamento de médicos generalistas, também, pode auxiliar na detecção de pacientes da atenção básica que necessitem de assistência em saúde mental”, defende ao justificar que isso possibilita o encaminhamento dessas pessoas a serviços especializados.

Conhecendo as causas
A teoria biológica defende que a depressão está relacionada com uma interação complexa entre a disponibilidade, a regulação e a sensibilidade de neurotransmissores como a serotonina, noradrenalina, dopamina e glutamato, conforme explica a psiquiatra. Entretanto, é possível que estressores ambientais ligados à pobreza, comuns em países tropicais, ajam como gatilhos em pessoas geneticamente predispostas à depressão. Ela realça que há também teorias psicodinâmicas que apontam a depressão como uma falha na resolução de conflitos do desenvolvimento, como a aquisição de confiança e de relacionamentos interpessoais.

Realidade brasileira
Apesar de existirem poucos dados em relação à incidência da depressão no Brasil, um levantamento realizado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), em 2011, com população residente na região metropolitana de São Paulo, sugere uma prevalência muito alta no País, chegando a 10,8% no último ano, contra 5,5% nos países ricos e 5,9% nos países pobres.

“A estimativa de depressão em toda a vida chega a 44,8%. Evidente que pesquisas envolvendo as populações de outras cidades e da zona rural são necessárias. Ainda assim, esses números precisam ser considerados com seriedade, especialmente levando-se em conta a relação entre depressão e suicídio”, pondera a médica ao lembrar que a incidência da doença é maior entre mulheres e idosos.

tristes-tropicos-pt

In tropical countries, many times, the real impact of mood disorders remains obscure, due to the existence of diseases considered more severe, such as AIDS and malaria

A recent study published in the PLoS Medicine points the need to consider depression as a relevant public health issue. The theme opens a discussion: are tropical and poor countries less happy? The question raises doubts, once the process to reach a depression diagnostic in poor countries is slower, besides many times the problem is not being identified or properly treated. Poor life quality, lack of basic infrastructure and access to leisure can favor depression, once its cause is multifactorial. “Considering people living in tropical countries are subjected to more stress factors, such as civil wars, domestic violence and misery, it is possible to believe they are more subjected to depression. However, the statistics show an opposite relation, with greater incidence in rich countries, not tropical”, observes Dr. Ana Luisa Lamounier Costa, doctor and psychiatrist from the Federal District’s Health Secretary.

According to a study published in Higher Education depression is a developing countries’ disease. However, the survey points that the increasing incidence of depression in the developing world is the result of enhancements in basic health services.

The specialist comments the answer to this paradox can be related to the easy access to research tools and psychiatric assistance in the developed countries, besides the cultural assimilation of depression symptoms. She stresses that in tropical countries, many times the real impact of mood disorders remains obscure due to the presence of more severe diseases, such as AIDS or malaria, predominant reality in poor countries. “In places struck by civil wars or natural disasters, this impact is even greater. This allows the governments to adjust their public health policies and not negligence attention to mental disorders”, reveals while pointing that, unfortunately, mental health assistance in Brazil is very deficient.

According to the psychiatrist, some studies relate depression to changes in genes involved with the serotoninergic system, but they are still very incipient to establish a genetic risk group. “Maybe the only way to minimize the impact of depression is to provide health quality to the population, especially regarding violence and misery prevention, besides easing the access to mental health services, such as psychology and psychiatry, for adequate time intervention”, signs.

Dr. Ana Luisa comments that in Brazil the progressive decrease of beds for hospitalization has not been accompanied by an increase in the availability of ambulatory services. According to her, the population’s access to psychology and psychiatry assistance is insufficient. “For an adequate attention, an immediate increase in ambulatory attention services, as well as the Psycho-Social Attention Centers (CAPS) provided with psychologists and psychiatrists. The training of general doctors, also, can help detecting patients from general assistance who may need mental health attention”, defends while arguing that this would allow forwarding these people to specialized services.

Knowing the causes
The biologic theory defends depression to be related to a complex interaction among neurotransmitters availability, regulation and sensibility, such as serotonin, noradrenalin, dopamine and glutamate, as explains the psychiatrist. However, it is possible that environmental stressors related to poverty, common to tropical countries, may act as triggers in people genetically more likely to depression. She highlights that there are also psychodynamic theories that point depression as a fault in resolving development conflicts, such as trust acquisition and interpersonal relations.

Brazilian reality
Although there are few data regarding the incidence of depression in Brazil, a survey by the World Health Organization (WHO), in 2011, with the population residing in Sao Paulo metropolitan Area, suggest a very high prevalence in the Country, reaching 10.8% in the last year, against 5.5% in rich countries and 5.9% in poor countries.

“The depression estimative in a lifetime reaches 44.8%. It is obvious that surveys involving populations from other cities and rural areas are needed. Yet, these numbers must be seriously considered, especially regarding the relation between depression and suicide”, ponders the doctor while remembering that the disease is more incident among women and senior citizens.